domingo, 25 de fevereiro de 2007

Soeiro da Costa (c. 1390-1472), um dos “Doze de Inglaterra”

Soeiro da Costa era pai de Afonso da Costa, alcaide-mor de Lagos, e avô do Dr. Cristóvão da Costa. Foi um dos “Doze de Inglaterra.”

Não há prova de sua filiação; mas foi, com certeza, filho ou neto de Afonso Lopes da Costa, que é atestado em Lagos em 1401, talvez já falecido a esta data. Soeiro teve um filho Afonso, e descendia de outro Soeiro, na linha de Afonso Lopes, que provinha dos alcaides-mores de Évora.

É um herói da cavalaria tarda. Conta-se que, tendo sido doze damas inglesas da melhor nobreza ofendidas em sua honra por doze fidalgos da terra, apelaram aquelas a seu rei, para que designasse campeões que por elas se batessem; mas nenhum campeão que lutasse pelas damas foi encontrado na Inglaterra. Lembrou-se então o rei que portugueses batiam-se com bravura e destemor, e apelou a cavaleiros de Portugal, para que viessem lutar pelas damas ofendidas. Doze cavaleiros lusos enfrentaram então em justas os doze ingleses ofensores, e venceram-nos, assim lavando a honra das damas inglesas. Esses doze cavaleiros ficaram desde então conhecidos como os Doze de Inglaterra. Os nomes desses cavaleiros - na verdade treze, em número - são conhecidos, e são, todos, personagens historicamente atestados: Alvaro Vaz de Almada (depois Conde de Avranches); Alvaro Gonçalves Coutinho, dito “o grão Magriço”; João Fernandes Pacheco e Lopo Fernandes Pacheco (filhos de Diogo Lopes Pacheco, um dos assassinos de D. Inês de Castro); Alvaro Mendes Cerveira e Rui Mendes Cerveira, também irmãos; João Pereira Agostim; Soeiro da Costa; Luis Gonçalves Malafaia; Martim Lopes de Azevedo; Pedro Homem da Costa; Rui Gomes da Silva e Vasco Anes da Costa, dito “Corte Real.”

Destes nos vai interessar Soeiro da Costa. Assim, diz o cronista Gomes Eanes de Zurara (1410-1474) na sua Crônica dos feitos da Guiné, “Ca hera hi Sueiro da Costa, alcaide daquella villa de Lagos, o qual era homem nobre e fidalgo, criado de moco pequeno na camara delrrey dom Eduarte [D. Duarte] e que se acertava de seer em muy grandes fectos; ca elle fora na batalha de Monvedro, com elrrey dom Fernando dAragom contra os de Vallenca, e assy no cerco de Vallaguer, em que fezerom muy grandes cousas, e foe com elrrey Lancaraao [Ladislau], quando barrejou a cidade de Roma; e andou com elrrey Luis de Proenca [de Provença], em toda a sua guerra. E esteve na batalha da Ajancout [Azincourt], que foe hua muy grande e poderosa batalha entre elrrey de Franca e elrrey de Jngraterra. Efora ja na batalha de Vallamont, cabo de Caaes, com o conde estabre de Franca contra oduque dOssestre, e na batalha de Monseguro [Montségur], em que era o conde de Fooes [Foix] e o conde dArminhaque [d’Armagnac], e na tomada de Samsooes [Soissons] e no decerco de Ras [Rheims?] e assy no decerco de Cepta [Ceuta] Nas quaaes cousas sempre provou, coomo muy vallente homem darmas.” (Algumas datas, para se precisar a cronologia: em 1411 acontece a batalha entre Luiz de Anjou, rei de Provença e Ladislau de Durazzo, rei de Napoles; em 27.2.1412 ocorre a batalha de Murviedro; de 1.8.1413 a 31.10.1413, o cerco de Balaguer; entre 1412 e 1413, a batalha de Montségur; em 1414, o cerco de Roma; em 25.10.1415, a batalha de Azincourt; e em 1418-1419, o cerco de Ceuta.)

Podemos reconstituir a biografia de Soeiro da Costa, em parte sobre conjecturas, em parte sobre o testemunho de crônicas como a de Zurara, e em parte sobre documentos. Soeiro da Costa terá nascido c. 1390, muito provavelmente em Tavira ou em Lagos, se seu avô (pai?) tiver sido - como se discutiu já - Afonso Lopes da Costa, que recebeu em 1384, do Mestre de Aviz, o prazo de uma azenha em Tavira. Em seguida vemos, já com vinte anos ou quase, Soeiro da Costa batendo-se nos principais campos de batalhas de começos do século XV, como o fizeram também Alvaro Vaz de Almada e o “grão Magriço.” Nos documentos, Soeiro da Costa aparece pela primeira vez em 8.5.1433, quando D. Duarte nomeia-o para o cargo de almoxarife de Lagos no Algarve, dizendo-o “seu criado.” Em 18.5.1439 D. Afonso V chama-o alcaide em Lagos no ato em que lhe concede uma tença anual de 200 000 libras. Está como alcaide-mor e almoxarife até 1450, embora seu genro Lançarote da Ilha apareça como almoxarife em 11.4.1443. Soeiro da Costa renuncia à alcaidaria-mor de Lagos em 1452, e em 5.2.1452, a pedido do infante D. Henrique, D. Afonso V nomeia Afonso da Costa, filho de Soeiro, para o posto de alcaide-mor de Lagos (em 3.1.1486 D. João II confirma Afonso da Costa como alcaide-mor de Lagos).

Ainda outra notícia, de verbete enciclopédico: “Tantas ações de cavalaria já o faziam célebre na Europa, e estando bem firmados os créditos do infante D. Henrique pelos sucessos dos seus descobrimentos, a cidade de Lagos, contra as murmurações dos críticos, quis fazer novo armamento no ano de 1445, para destruir a ilha de Arguim, que muitos prejuízos causava, e entregou juntas 14 velas ao capitão Lançarote da Ilha (ou de Freitas), que fora criado do infante D. Henrique, no foro de seu moço da câmara, e era almoxarife de Lagos, por mercê do mesmo infante. Soeiro da Costa, apesar de já ter certa idade mas que não afrouxara como militar aguerrido, ofereceu-se generosamente, e lhe foi dada a capitania de uma delas; as quais, todas reunidas a mais 12, com que os de Lisboa e da ilha da Madeira, nesta facção mais de honra que de interesse, nada quiseram ceder aos de Lagos, saíram daquele porto a 10.8.1445. Separadas as caravelas por um forte temporal que sobreveio, cada uma com incerto rumo buscava sítio diverso ao longo da costa; mas como prudentemente, Lançarote havia determinado que, no caso de tempestade, todas demandariam a ilha das Graças para se reunirem, e ali se foram juntando umas às outras, e chegadas depois a Arguim, entraram na ilha afugentando todos os habitantes, podendo apenas lançar mão a 12 homens, que destemidos se arriscaram com as armas na mão a defender-se, combatendo com os nossos, dispostos a morrerem e não a se renderem. Nesta ação mostrou Soeiro da Costa qual seria o seu esforço em lances mais arriscados, e não contente com a vitória, com a espada tinta em sangue infiel, como quem prezava mais a religião que o valor militar, pediu que o armassem cavaleiro para de novo se alistar naquela conquista do Evangelho, e havendo recusado outras vezes esta honra na Europa e de mãos reais, agora a requeria em memoria daquele triunfo, aceitando-a da mão de Álvaro de Freitas, comendador de Aljezur, tendo a glória de o acompanhar o capitão Diniz Eanes de Gram, escudeiro do infante D. Pedro e sobrinho de Gonçalo Pacheco, que fora anteriormente criado do infante D. Henrique, e então já aposentado no oficio de tesoureiro­-mor da Casa de Ceuta, que recebeu conjuntamente a mesma dignidade de cavaleiro. Lançarote da Ilha seguiu viagem, ambicioso de maior gloria, e Soeiro da Costa retirou-se para o reino, acometendo de passagem o Cabo Branco e a ilha de Tider, recolhendo-se a Lagos vitorioso, e com muitas presas que trazia. Soeiro da Costa foi casado com Mécia Simões, filha de Gil Simões, alcaide-mor de Estoi (também no Algarve), de quem teve uma filha, que casou com o capitão Lançarote.”

Soeiro da Costa morre em 1472; já estava falecido de pouco em 14.8.1472, pois a partir de janeiro de 1471 ainda recebia, por mercê de D. Afonso V, uma tença de 5 mil reais de prata. Fora casado, como ficou dito, com Mécia Simões, ainda viva no tempo de D. João II, filha de Gil Simões que tinha a alcaidaria-mor de Estói, localidade junto a Faro.

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